O cavalo de Turim

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Jul 10, 2017
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Filosofia
Cinema
Friedrich Nietzsche
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Nietzsche, brilhou precoce em Basel, desabou em Turim ao defender um cavalo e sucumbiu à loucura sob cuidados de sua irmã.
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Entre as provações que marcaram a vida de Friedrich Wilhelm Nietzsche (15 de outubro de 1844 – 25 de agosto de 1900), a lucidez despontou como sua mais dura maldição.
Órfão de pai aos cinco anos, o jovem Nietzsche cresceu num lar feminino, cercado pelos ecos de beatas melancólicas e de sua mãe, duas irmãs e a avó. A solidão, porém, fomentou-lhe o gênio: aos vinte e quatro anos, já ocupava a cátedra de Filologia Clássica na Universität Basel, tornando-se um dos mais jovens professores da Europa.
Mas o brilho intelectual, longe de salvá-lo, exacerbou-lhe as dores: fatigado pelas enxaquecas e pela tuberculose que o perseguiram, Nietzsche abandonou a docência em 1879 e passou a viver errante. Sem pátria fixa, viajou pela Suíça, Itália e França.
Um filósofo errante, perseguido por sombras e castigados por pensar “além do bem e do mal”, redige a maior parte de suas obras. Põe sua maldição no papel, como quem a arranca de suas entranhas. São frases soltas e poemas filosóficos que podem provocar auneurismas aos desavisados. Publica também, mas ninguém o compreende, ninguém quer.
Agora, isolado, e atormentado por enxaquecas infindáveis, já perdendo a visão e restando-lhe apenas a pouca sanidade que dispunha, perdido em si. Niezsche é um inquilino em seu quarto com catre e cadeira, e um banheiro no corredor.
Assim, em Turim, em janeiro de 1889, seu destino sofreu um golpe fatal. Ao presenciar um cocheiro açoitando violentamente um cavalo, um cavalo que se recusa a caminhar para seu “dono”, um camponês. Ao longe, ouvem-se brados enraivecidos contra o indefeso animal.
Nietzsche, em completo desespero, a ranger os dentes, com ódio feroz, arremeteu-se contra o covarde algoz em defesa do sofrido animal, e abraçando-o sob olhares atônitos, como alguém que tenta deter as brutalidades dos golpes com o próprio corpo, até desfalecer em lágrimas… para nunca mais acordar.
Perde os sentidos e é levado para cas,a onde permanece em silêncio por dois dias. Era uma vez, o fim do maior filósofo desde Kant, abraçado ao cavalo, compartilhou seu tormento, um tormento alheio, catatônico, sem frases inteligíveis, de olhar vago, babando.
Internado primeiro em Turim e depois em Basiléia, Nietzsche jamais recuperou a sanidade. Durante a última década de vida, viveu sob os cuidados obsessivos de sua irmã Elisabeth, que não compartilhou da lucidez do irmão, e cuja visão enublada ajudaria, postumamente, a usurpar seus escritos em prol de ideologias alheias ao seu espírito livre, deturpando-os para a lastimável interpretração de Nietzsche pelo nazismo.
Isolado, escravizado pela febre criativa e pelos delírios, Nietzsche morreu aos cinquenta e cinco anos, deixando um legado além do bem e do mal, profundo, duradouro e de poesia filosófica que, até hoje, canta como um lamento sublime.

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Entre as obras-primas do cineasta húngaro Béla Tarr destaca-se “O Cavalo de Turim” (A Torinói Ló), agraciado com o Urso de Prata (Grande Prêmio do Júri) no Festival de Berlim em 2011. Em seu portfólio, encontram-se também os épicos “Sátántangó”, “Perdição”, “O Homem de Londres” e “A Harmonia Werckmeister”, filmes que moldaram a paisagem do cinema europeu contemporâneo.
Um filme monocromático em referência direta ao evento do colapso de Nietzsche. No entanto, não nos conta sobre a história do filósofo errante. A partir deste evento, o filme busca recriar o percurso do camponês e sua filha, assim como do cavalo doente em sua existência dolorida. De resto, apenas interpretações, aproximações e entrelinhas de um filme que possui a força artística para arrebatar, logo de pronto, os apreciadores da sétima arte.
Assista ao trailer e deixe-se envolver por este poema visual:
Bom filme!
*O texto inicial dessa publicação tem caráter fictício.
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